Padrões e sinais em VC

Ótimas análises da Blume Ventures, gestora de VC na Índia, no seu report Omega Files. A seção que traz Signals and Patterns é especialmente interessante, destacando padrões dos investimentos que tiveram os maiores retornos (MOIC) em seus fundos.

Alguns insights relevantes da apresentação:

  • Empresas que atacaram mercados com baixa competição tiveram os melhores retornos, seguidas por aquelas que competiram contra grandes players consolidados. Já mercados altamente fragmentados geraram os menores retornos.⁣
  • Empresas que pivotaram e passaram por uma “near death experience” tiveram retornos superiores.
  • Para alcançar retornos maiores, é preciso mirar um TAM maior do que o nicho inicial.
  • Mas antes, as empresas de maior sucesso começaram atacando um nicho antes de expandirem para um TAM maior
  • Por fim, talvez o mais difícil de acertar: o “timing”. First Mover Advantage vs. On-Time Arrival. Chegar um pouco depois, mas na hora certa, pode multiplicar o retorno

O relatório completo traz muitos outros dados interessantes para quem gosta de estudar padrões (como eu). Vale a leitura.

Notas sobre uma análise do volume de funding nos setores do Brasil nos últimos cinco anos

Analisando volume de funding nos diversos setores do Brasil entre 2019 e 2024, fiz uma divisão entre rodadas menores que US$ 10 milhões e maiores que US$ 10 milhões. Essa separação traz insights relevantes sobre o ranking de cada perfil de investimento no país e a progressão dos diferentes setores para o late-stage.

  • Principais insights:
    • Fintech domina o investimento no Brasil, com cerca de 40% do total do funding, tanto no early stage quanto no late stage, com ampla vantagem sobre os demais setores.
    • Healthtech é o segundo setor com maior volume de funding em rodadas menores que US$ 10 milhões, mas cai para a oitava posição em rodadas maiores.
    • Agritech e Edtech têm forte apelo devido ao potencial do Brasil e às oportunidades evidentes, mas ainda não consolidaram uma tese que justifique uma maior concentração de capital.
    • Proptech, Energia e Logtech são os setores que mais ganham relevância quando se trata de concentração de capital em rodadas maiores ou late-stage. Diria que são setores característicos do Brasil, com problemas estruturais significativos e forte correlação com o PIB.
    • Deep tech e IA já têm um papel relevante em rodadas maiores.
      • Se considerarmos apenas 2024, Deep Tech já aparece entre os quatro setores mais relevantes em rodadas menores que US$ 10 milhões.
  • Notas finais:
    • Isso não é uma recomendação de investimento, mas uma análise para refletirmos sobre oportunidades em cada setor. Vale lembrar que ser contrarian (e estar certo) é onde estão os maiores ganhos.
    • Por fim, um ponto importante: o ideal seria analisar esses dados por coortes anuais ou bienais, para entender a evolução da maturação do funding de um estágio para outro e como os setores progridem ao longo desses ciclos.

Power Law e a Gestão do Portfólio dos VCs

Vi esse interessante tweet do Reid Hoffman, que traz nos comentários as diferentes visões de investidores sobre o tema.

No geral, a grande maioria dos VCs acredita que o tempo dedicado ao portfólio deve ser majoritariamente voltado para as empresas que estão escalando, e não para aquelas que enfrentam dificuldades. Essa é uma discussão recorrente sobre gestão de portfólio de VC, que sempre presenciei por onde passei. É uma realidade importante para os empreendedores compreenderem.Essa abordagem de gestão geralmente divide o portfólio em três blocos, com base na teoria do Power Law para portfólios de VC:

  1. 20%-30% das empresas: São as que estão escalando com grande potencial de retorno para o fundo (10x+).
  2. 40%-50% das empresas – “Messy Middle”: Startups que conseguiram criar algo relevante e alcançaram um patamar significativo de receita, mas que pararam de crescer. O fundo enxerga um potencial de retorno entre 2x-5x.
  3. 30%-40% das empresas: Caminham para não gerar valor, resultando em um retorno de 1x ou menos.

A questão crítica dessa discussão é que, normalmente, as melhores empresas não precisam da ajuda do VC. Já as que mais precisam ou pedem suporte são justamente as do segundo e terceiro bloco. Ou seja, mais empresas demandando mais tempo.

Agora, uma provocação para os VCs: será que as empresas do bloco 1 realmente não precisam de ajuda? Ou será que elas apenas não precisam da sua ajuda, ou daquilo que você, como investidor, pode oferecer?

Minha visão é que o investidor precisa entender a relação entre tempo, esforço e retorno esperado na gestão do portfólio de seu fundo e agir de acordo com o que trará o melhor retorno. Mas é fundamental pensar além da gestão do fundo e considerar também a gestão da gestora de investimentos. Construção de carreira no longo prazo envolve relacionamentos, reputação e ciclos. Nesse contexto, dedicar-se ao desenvolvimento das empresas pode gerar frutos no futuro.

Além disso, investidores com um propósito educacional e de fortalecimento do ecossistema ou da economia local tendem a ter um apetite maior para ajudar e criar iniciativas voltadas às empresas dos blocos 2 e 3.

Acredito que essa realidade não é tão enfatizada no dia a dia dos grandes investidores como no post do Reid Hoffman. Os fundadores precisam conhecer a fundo a gestão do portfólio do fundo e entender que o alinhamento de trilha acontece desde o início. O Fred Wilson, investidor renomado da USV, escreveu um ótimo texto onde argumenta que as empresas que realmente definem a performance de um fundo são as do segundo quartil.

Nota / A Ciência do Acerto – Baseball vs. Investimentos

Adoro do cruzamento de lições dos esportes com investimentos. Li recentemente essa compilação de lições de investimentos tiradas do livro “The Science of Hitting” e achei incrivelmente perfeitas as analogias do baseball com investimento, e em VC, principalmente. Alguns dos meus highlights – (traduzidos livremente por mim):

  • “4 | Você melhora com a prática real de rebatidas; é assim que se aperfeiçoa.
  • 6 | Não vá e bata todas as bolas que vêm em sua direção. Espere por boas bolas para acertar, não bata em bolas ruins; nem os melhores conseguem acertar bem bolas ruins.
  • 7 | Existem vários tipos de arremessos virão em sua direção – bolas rápidas, curvas, com efeito, sliders, spitballs.
  • ➡️ Na vida real, existem muitos tipos de empresas para você investir, que continuarão surgindo. Achamos que 99% das empresas não valem o investimento, e apenas uma lista pequena de empresas se encaixa no que buscamos.
  • 8 | Um rebatedor começa a perceber onde estão suas zonas favoritas para bater, esperando por arremessos específicos no ponto ideal e na sua zona de strike.
  • ➡️ Com o tempo (anos), quando você começa a perceber qual é o seu ponto ideal e sua zona preferida de strike, suas chances de sucesso começam a aumentar ao longo do tempo.
  • 10 | Haverá decisões ruins, e você não pode fazer nada a respeito. O melhor é esquecer e se concentrar no próximo arremesso.
  • ➡️ Você terá movimentos errados, perdas, e errará. Nem sempre você acertará. Na maioria das vezes, o mercado tende a acertar mais do que você imagina no longo prazo.
  • 11 | Comece a reconhecer padrões com um framework para adivinhar melhor, em vez de adivinhar cegamente. Desenvolva a disciplina para esperar as boas bolas para acertar.
  • “Obviamente, você não simplesmente “adivinha” uma bola curva ou “adivinha” uma bola rápida. Você trabalha com uma referência, aprende o que esperar em certas situações e faz sua aposta a partir daí.”
  • 13 | Faça o arremessador lançar para que você obtenha informações, e eventualmente ele lhe dará o arremesso que deseja.
  • 15 | Ted Williams começou como arremessador, para entender como rebater.
  • ➡️ Ações são participações em negócios. Gerenciar um negócio ajuda a entender investimentos em empresas. Se você não gerencia, pode aprender sobre negócios e praticar com dinheiro real.
  • 16 | Arremessadores não estudam rebatedores. Tudo o que eles querem é lançar a bola. O pior é um arremessador que não sabe onde está lançando.…”

Esses são meus highlights. O post tem outras lições que vale checar.

A Eficiência até $100mn de receita em mercados emergentes

A Sturgeon Capital fez uma série de três posts avaliando a necessidade e eficiência de capital para se chegar até $100mn de ARR nos mercados emergentes, como Índia, México e Brasil. Os posts estão separados por modelo de empresas como Marketplace, Fintech e SaaS.

Alguns destaques que achei interessantes:

  • Marketplaces: A alta necessidade capital para construir os marketplaces líderes de categorias. Me relembra a discussão do IPO da Instcart e a dificuldade de retorno de capital pelos investidores late-stage.
  • Fintechs: Mais que marketplaces, Fintech captaram mais recursos do que marketplaces, mas mostraram uma capacidade de aceleração mais rápida, em período menor de tempo, até os $100mn de ARR. O Top quartil conseguiu chegar a esse patamar de receita em apenas 4 anos.
  • SaaS: Como esperado é o modelo mais eficiente e o menos rápido dos três.

O autor do estudo não é brasileiro, e o dólar é cruel em terras tupiniquins, mas acredito que faltaram alguns outros bons cases brasileiros de empresas que estão chegando em $100mn com eficiência de capital razoável, em menos de 10 anos. De qualquer forma, é uma ótima referência de leitura para late-stageParte 1Parte 2 e Parte 3.

Desalinhamento na trilha de VC

Estava lendo sobre esse artigo de captables recentemente e recomendo a leitura. Ele é bem completo sobre o assunto e bem relevante, principalmente em um cenário de mercado em que têm sido feitas Extensões e Rodadas Pontes para reajustar os objetivos e financiamento para conquistá-los. O artigo traz de forma clara os problemas que um captable comprometido pode gerar para o futuro de uma empresa que busca crescer com capital de venture.

Mas, o que eu tenho pensado mais profundamente nos últimos dias, é sobre o desalinhamento entre diferentes perfis de investidores de VC, dentro da rota de construção de um negócio de bilhão. E me parece claro que esse desalinhamento está muito relacionado ao gap da expectativa de retorno do equity de cada investidor que, para as empresas, reflete em consequências em captable e decisão de caminhos estratégicos.

Acredito que a diversidade de teses e perfis entre investidores pode ser positiva, tanto para atender LPs como para diversificação, com o desafio do empreendedor em diferentes estágios de evolução. Porém, essa diversidade traz uma necessidade diferente em relação à visão de sucesso daquela oportunidade. Por exemplo, uma saída avaliada em R$ 200 milhões em um estágio de Series-B pode ser uma saída bem sucedida para Anjos e Micro-VC, mas é longe do ideal para um fundo Seed ou Series-A institucional.

O artigo sobre Captable que citei no início traz o reflexo dessa dinâmica no retorno para um fundo pequeno e um grande.

“O tamanho do fundo é a sua estratégia”

O conceito de Fund Returner – retorno do investimento com o potencial devolver o tamanho total daquele fundo que está investindo nele – é um bom modelo mental para entender a exigência de saída de um fundo. Além disso, a diferente expectativa exigirá diferentes exigências entre participação e termos (como liquidation preferences, drag/tag along, etc…) para cada investidor ao longo da rota. Não ter isso em mente pode ser crucial para o sucesso desejado para o founder, de um negócio de venture.

Esse desafio fica bem claro quando a gente faz a conta. Para o investimento retornar um fundo de tamanho de $100 milhões, pensando que no exit o fundo deterá cerca de 5%, a empresa vendida deverá ser avaliada em mais de U$ 2 bilhões. Em um período de 10 anos, essa empresa precisará de um faturamento de ao menos $200mn por ano.

Isso se intensifica ainda mais em uma geografia de Brasil em que a mediana de exits nos últimos anos foi de cerca de U$137 milhões e transações de mais de $1 bilhão são poucas. Vale mencionar uma tendência positiva é que o tamanho médio de exits no Brasil tem crescido.

No final do dia, para os investidores, isso implica em desafios de desenvolvimento de negócios e alinhamento com outros fundos ao longo da jornada, em que fundos menores deverão trazer fundos maiores em rodadas seguintes. Para founders, isso implica na atenção ao alinhamento dos investidores com a sua rota e visão de crescimento do negócio longo prazo.

Esse desalinhamento faz parte da jornada, e ainda não vejo uma solução, apenas remediações – como termos, recaps e saídas secundárias -, mas saber que ele existe já um bom início para moderá-lo com intenção.